sexta-feira, 29 de setembro de 2017

O que fazer quando acaba o tesão, mas o amor não


Todo dia ela faz tudo sempre igual. Acorda cedo, leva os filhos à escola. Chega ao trabalho e pula de reunião em reunião. Não raro, almoça em cima da mesa ou em 20 minutos no quilo ao lado do escritório. Isso tudo sem deixar de responder mensagens e e-mails, ficar horas no trânsito. À noite, ao pisar em casa, só pensa em comer alguma coisa, tomar uma taça de vinho e relaxar. Mas o marido está ali, esperando para discutir uma lista de problemas da família. Se fosse um caso isolado, a solução seria respirar fundo e esperar o outro dia. Mas não tem uma noite que não seja assim na rotina dos paulistanos Clara*, 38, jornalista, e Jorge*, 36, publicitário, casados há dez anos e com dois filhos, de 11 e 6 anos. Desde que perdeu o emprego, em 2015, Jorge deixou de ter não apenas uma renda de R$ 20 mil mensais, como também a autoestima.

“Sempre mantive a casa. Meu mundo desabou”, diz ele. “Me senti fragilizado. Amo a Clara, ainda mais do que no começo do namoro, mas transar era a última coisa que me vinha à cabeça. Minha virilidade foi embora com o emprego”, desabafa ele que, no fim do ano passado, abriu uma consultoria para sites, que ainda não dá lucro. Com os R$ 5 mil de seu salário, Clara paga as contas da casa. O padrão de vida da família caiu drasticamente. Viagens, idas a restaurantes e tudo que é supérfluo simplesmente foi cortado. “Jorge virou dono de casa e isso me brochou. Não aguentava mais vê-lo sentado na sala assistindo à TV. Quase nos separamos três vezes. Precisei pedir dinheiro ao meu irmão, foi desesperador”, diz ela. “Não terminamos tudo naquela época porque realmente nos amamos. Não vivo sem ele. É um ótimo pai, tem caráter. É o homem que escolhi. Mas temos um problema na cama. Hoje só transamos quando estamos bêbados. Cerca de uma vez por mês.”
Realidade muito diferente da de antes. “Nem o nascimento dos filhos havia abalado nossa vida sexual. Esperava por ele ansiosamente todos os dias. Nos trancávamos no banheiro escondidos das crianças só pra fazer uma farrinha rápida. Era uma delícia!”, lembra Clara.

A LIBIDO COMO VÍTIMA O dia a dia de Clara e Jorge não está distante do de boa parte daqueles que estão em relacionamentos longos e estáveis. Um estudo feito pela Universidade de Chicago em 2012 mostrou que 15% dos casais que vivem sob o mesmo teto estão entre dois e seis meses sem sexo. No caso dos paulistanos, foi a crise financeira o gatilho para reduzir o desejo. Mas há muitas outras razões para que isso aconteça. De acordo com uma pesquisa do Instituto do Casal, de São Paulo, realizada no ano passado, cerca de 56% dos entrevistados considera que a vida sexual está ruim ou regular. E a rotina é a recordista absoluta das reclamações. “O cotidiano em família, a falta de novidade (já que um conhece muito bem o outro) e pouco tempo para sedução são fatores que desgastam o casal. Mas a maioria só presta atenção nesses detalhes quando a crise está instalada”, explica a antropóloga Mirian Goldenberg, autora de Sexo (Record, 160 págs., R$ 31). A frequência, segundo ela, também está ligada ao equilíbrio da relação. “Preliminar é o que se faz nas 24 horas do dia e não nos 20 minutos da cama. O sexo é o conjunto da obra e não a prioridade.”

O longo tempo de relacionamento foi uma razão para a perda do tesão da designer gaúcha Lucia de Menezes, 37, e do fotógrafo gaúcho Ricardo Toscani, 37, juntos há 16 anos e pais de Alice, de 8. Mas não o principal: em 2015, Lucia foi diagnosticada com uma doença que mexe profundamente com a rotina e a autoestima da mulher, o câncer de mama. “Me sentia completamente sem energia. A pouca que restava usava para me alimentar e cuidar da minha filha. Pensava muito no futuro dela”, diz. “Não rolava transar no meio de tudo. Ricardo foi um superparceiro, ficou ao meu lado. Mas em determinado momento voltou a querer transar, e eu não. Chegamos a brigar por causa disso.” Para ele, a doença da mulher não a fez ficar menos atraente. “Ela continuou linda o tempo todo, mesmo quando estava no hospital”, conta. “No início segurei a onda, mas depois não sabia o que fazer com o tesão. Não dava para colocar debaixo do tapete. Fui para a terapia. Foi o que ajudou.”

Enquanto a libido do casal andava em baixa, Toscani encontrou prazer na corrida. “Nunca pensei em ter uma amante. Meu amor é maior que o desejo. Então, numa noite, saí correndo para aliviar a tensão de não transar. O esporte virou hábito.” Hoje curada, Lucia retomou a vida sexual, com o apoio incondicional do marido. “Ela tirou uma das mamas, o que não fez a menor diferença para mim”, afirma Toscani. “Casei com o conjunto. Sexo não é só o corpo, é também afinidade e admiração entre duas pessoas”, completa.

ROTINA IMPLACÁVEL Nada é, no entanto, mais cruel para a vida sexual de um casal do que a estafa. Segundo uma pesquisa realizada no ano passado pelo Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Hospital das Clínicas, em São Paulo, o cansaço é um dos principais motivos do desgaste da relação (57,3% das mulheres e 50,1% dos homens). É essa a queixa da advogada Ana Paula de Andrade Monteiro, 43, advogada, casada há 13 anos com o designer Sandro Monteiro, 44. “As tarefas profissionais e da maternidade me deixam exausta. À noite, durante a semana, só penso em dormir”, diz a paulistana, mãe de Vitor, de 9 anos. “Quando não tínhamos filho, conseguíamos equilibrar a rotina. Mas, a partir do momento em que nasceu, focamos somente nele. Foi um erro”, diz Sandro. “Cheguei a dizer para a Ana: ‘Você deixou de ser minha mulher e é só a mãe do Vitor’.”
Além disso, há dois anos, o pai de Sandro adoeceu e ele precisou passar um tempo no hospital. Foram meses sem sexo. “Eu tocava o cotidiano da casa sozinha. Um dia o chamei para uma conversa definitiva porque nos amávamos, mas estávamos em sintonias diferentes. Tínhamos um filho e precisávamos resgatar o carinho, o respeito um pelo outro”, diz ela. Funcionou: estabeleceram novas regras para as tarefas domésticas e decidiram fazer programas só os dois, como jantares e atividades físicas. “Hoje vamos ao clube, os assuntos em comum voltaram. Tínhamos nos deixado em segundo plano. Aí não tem jeito, o tesão some”, conta Ana, que, no ano passado, foi com o marido para a Argentina. “Nosso filho ficou com meus pais. Foi ótimo. Transamos todas as noites.”

Para a psicóloga Vanda Lucia Benedito, autora de Amor Conjugal e Terapia de Casal (Summus, 120 págs., R$ 44), detectar a falta de tesão e ter paciência são os passos mais importantes. “O casal precisa reaprender a valorizar os aspectos positivos do outro, muitas vezes esquecidos quando a união é longa. Pode ser com conversa, com terapia... Não é fácil. Mas é possível”.

Fonte: Marie Claire

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